DIFERENCIANDO O QUE É AVANÇO
ISAC
JORGE FILHO
É inegável o avanço
tecnológico da Medicina. Não se pode falar o mesmo dos aspectos éticos e de
relacionamento. O exercício profissional da medicina em consultórios e
ambulatórios tem se tornado gradativamente mais complicado, a começar pelo
atendimento em unidades de saúde e pronto-atendimentos. O sistema de plantões
leva a uma quebra da relação médico-paciente. O retorno do paciente para trazer
exames ou a continuidade do tratamento dificilmente encontrará o mesmo médico,
obrigando, a um reinício de relacionamento. Mas, nos consultórios privados os
costumes também estão mudando e, do meu ponto de vista, para pior. Vários
pontos merecem consideração. Vamos, hoje, nos ater às dificuldades
de se lidar corretamente com a Internet, não sendo raros os desencontros porque
o paciente, escudado em leituras de trechos de internet, cuja origem e
interesses sequer conhece, envolve-se de “autoridade” em conhecimento
especializado e passa a contestar condutas e informações de seu médico. Está
quebrada uma relação fundamental e a insistência em sua continuidade será
fadada ao insucesso. Sei de situações nas quais o profissional explicou que não
iria mais atender o paciente que tinha claramente escolhido o “Dr.Google” como
seu “médico de confiança”. Cabem aqui duas considerações. A primeira é a falsa
ideia de que o médico é obrigado a atender a todos, sob pena de ser denunciado
por “omissão de socorro”. Na verdade, diante de situações graves, não só o
médico é obrigado a atender como até os não médicos, por exemplo, em
casos de atropelamento. É claro que o médico tem todo o interesse em atender
todos, até porque é sua profissão. No entanto, o Código de Ética Médica é bem
claro quando em seu Capítulo I, inciso VII determina que “O médico
exercerá sua profissão com autonomia, não sendo obrigado a prestar serviços que
contrariem os ditames de sua consciência ou a quem não deseje, excetuadas as
situações de ausência de outro médico, em caso de urgência ou emergência, ou
quando sua recusa possa trazer danos à saúde do paciente.” A segunda consideração diz respeito ao papel da
Internet que, sem dúvida, é um importante e revolucionário meio de informação e
atualização, mas que não substitui, de forma alguma, a presença do médico e a
relação médico-paciente. É bom que o paciente saiba que não existe um controle
de qualidade ou um Conselho Editorial na Internet, ou seja, a pessoa escreve o
que quer. Muitas vezes é verdade e importante, muitas outras é besteira pura ou
está ligada a interesses comerciais. Entre no “Google” e procure, por exemplo,
“tratamento com urina humana”. Você vai regredir alguns séculos a um tempo que
isto era tido como verdade absoluta. Nesta linha, você pode encontrar o que
quiser na Internet, muitas coisas sérias no meio de muita bobagem. O problema é
que não há um sistema para diferenciar um do outro. Talvez o único seja
conversar com seu médico de confiança, mas, não estabelecendo polêmica no papel
de “médico graduado pela Internet”, e sim buscando, como paciente, esclarecer
suas dúvidas. Nesta situação, e procurando sítios de sociedades ou revistas
médicas sérias, a Internet será de grande valor e até reforçará a relação
médico-paciente, pilar sobre o qual se assenta a medicina exercida com
seriedade.
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ISAC JORGE FILHO é
Médico, Doutorado em Cirurgia, Professor Universitário e Ex-Presidente do
Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo.
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