21 junho 2014

Cidadania/ Política Internacional/ Drones/ Sérgio Roxo da Fonseca

DRONE

                                                                                          Sérgio Roxo da Fonseca


            Walter Benjamin foi um filósofo judeu nascido na Alemanha. Afirma-se que, supondo ser preso pelos nazistas, preferiu matar-se. Com certeza deixou uma obra extraordinária.
            Ao refletir sobre a guerra, destacou que sobre ela, como sobre tudo, seria um equívoco pesquisar sua essência examinando-a sobre a ótica daqueles que sabiam apenas que a guerra era a guerra. Ninguém pode conhecer a guerra discutindo apenas a guerra. Nada é apenas a sua essência.
            Observa que, no seu tempo, os soldados eram preparados para matarem-se uns aos outros em busca da vitória de sua Pátria. Em verdade, até o final da II Guerra Mundial, o Direito Internacional proibia, como crime de guerra, atacar alvos civis. Nos dias 6 e 9 de agosto de 1945, os Estados Unidos lançaram as únicas bombas atômicas sobre as cidades de Hiroshima e Nagasaki, revogando definitivamente aquela proibição. É relevante registrar que outras nações, em menor proporção já haviam cometido o mesmo pecado, é claro, sem aquele incomensurável tamanho.
            Walter Benjamin, com certeza, estava prevendo que no futuro as guerras não seriam resolvidas apenas pelos soldados. Possivelmente a guerra de guerrilhas, na qual o guerrilheiro se confunde com a população civil, seria o resultado do choque entre forças aparentemente desprovidas de uniforme ou de rosto.
            Tomando-se como data o final da II Guerra Mundial, a tecnologia passou a revelar cada vez mais armas tendo como alvo a população civil, mantendo o soldado como operador de aparelhos, muitas vezes, distante do campo da batalha.
            O mais novo equipamento chama-se drone que, ao que parece, significa zangão em inglês. Tive oportunidade de conhecer um drone na semana passada, na cidade de Campos do Jordão, na inauguração de um shopping.
            Aos serem inauguradas as portas, o locutor revelou que um drone, voava vagarosamente sobre os presentes. Filmando tudo.  Todos olharam para o céu e lá realmente estava um aparelho, cheio de luzes, com cerca de um metro da frente aos fundos. Insisto em dizer, voando baixo e vagarosamente. É escusado dizer que, pelo pequeno tamanho, o operador não se encontrava no seu interior, provavelmente num lugar perdido na distância.
            Entramos no corredor do shopping. Nós e o drone. O artefato passou a voar baixo, bem baixo, bem devagar, dobrando os corredores como se dispusesse de mil olhos. Incrível. De agora em diante, os seguranças poderão ser substituídos por um aparelho voador e não tripulado. E na guerra? Na guerra como na guerra, diziam os sábios. Os países árabes estão conhecendo a nova descoberta.

              

13 junho 2014

Luiz Gaetani, Roberto Minczuck, Feres Sabino : Cidadania

O homenageado que homenageou
Feres Sabino*
Se a gratidão é a memória da alma, não foi só a regência da Orquestra Sinfônica de Ribeirão Preto,  na celebração de seus noventa anos de vida, que  revelou  o humanismo do maestro Roberto  Minczuck cuja fala sempre o coloca no seio de  sua família e  filhos.   Protagonista, foi homenageado.
Ele narra o seu lugar no mundo, como se fosse um viajante cósmico, que passasse para aprender, ensinar e seduzir  pela musicalidade,  que encontrou o fluxo de sua sementeira, na terra de tantas fronteiras, tantas culturas, tantas línguas. O som coletivo de sua regência, sob a qual homens e mulheres  se dedicam com humildade, emoção, capacidade  e disciplina,  esparrama-se, como um plantio divino, que a mais antiga arte sabe trabalhar, sem limite de tempo e lugar.
 Estava  ali, naquele palco a leveza de sua  “coreografia”  de braços longos e mãos movediças, desenhando no ar as notas e o compasso de tantos instrumentos. A forte  expressão corporal revela o  domínio pleno  da arte amadurecida,  que tem a Orquestra Sinfônica de Ribeirão Preto, como concausa de seu mérito, num tempo inicial de seu trabalho disciplinado.   Nesse período conheceu dr. Luiz Gaetani, que o tratou como filho, apoiando-o –-- di-lo assim – incondicionalmente, apoiando-o em todos os aspectos, e englobando  nesse carinho  sua própria e toda família. Como um pai para seu filho.
Foi homenageado e veio para homenagear.
Foi  homenageado, pois a marca digital de sua carreira está em muitas lembranças materializadas, tal como a reinauguração do Teatro Pedro II, por exemplo, ou o depósito continuado de esperança na juventude  com o seu – “A Juventude tem Concerto”- , que o tempo se encarregou de esticar, na repetição, que nunca acabou, nem acabará.
Homenageou a orquestra e os amigos dela, a cidade hospitaleira,  que o acolheu,  quando estava , há pouco, na  caminhada de artista da arte de reger uma Orquestra Sinfônica.
Mas, o ponto alto de sua visita teve poucas testemunhas. Uma delas, num fiapo de conversa, comentou o acontecido em três horas de visita ao inesquecível e dedicado  dr. Luiz Gaetani.  Ele se encontra recolhido, em uma casa de repouso,  onde  ou descansa  em algum sonho definitivo de sua vida, ou remove na mente inerte a lembrança  dos  benefícios que trouxe à cidade de seu coração, ou, quem sabe, retorna à realidade, como um meteoro, para rever ,  assim rapidamente,  a Orquestra que foi o culto de sua dedicação e trabalho, por  anos e anos a fio, como seu Presidente,  de 1976 a 2000.
Roberto    Minczuck   aprofunda e revela a essência do seu ser, nessa visita   ao homem que nele acreditou, e  que tanto o prestigiou. Ele ficou  sentado ali, por três horas, de mãos dadas, conversando com seu monólogo, desejando que o amigo o compreendesse, ou que  desse a ele, ao menos,  a ilusão de uma só resposta, ou a ilusão de um só gesto, de um sorriso  quiçá,  forçando esquecer aquele olhar vidrado às vezes,  esperando, com ânsia contida, que conseguisse medir o sentido da sua presença fraterna , a gratidão aprisionada pelo não-sentir, nem ouvir, nem o não-responder do amigo doente.
O silencio foi umedecido pelas lágrimas do Maestro vitorioso.

Foi assim que o homenageado homenageou.

12 junho 2014

Bioética: cuidados paliativos e tanatologia.

REFLEXÕES SOBRE CUIDADOS PALIATIVOS E TANATOLOGIA
“A visão holística do ser humano nos cuidados paliativos busca cuidar quando já não é mais possível curar”
Isac Jorge Filho*
“E somos Severinos,
iguais em tudo na vida.
Morremos de morte igual, 
da mesma morte Severina,
que é a morte de que se morre 
de velhice antes dos trinta, 
de emboscada antes dos vinte,
de fome um pouco por dia.”
Em “Morte e Vida Severina” João Cabral de Mello Neto consegue, com os versos acima, definir a morte intolerável, a morte que não se pode aceitar, seja ela pela violência do trânsito, do crime ou da guerra, seja por fome ou outros problemas sócio-econômicos que acabam por constituir a chamada mistanásia, no dizer de Márcio Fabri dos Anjos. A cada 3,6 segundos morre uma pessoa de fome em nosso planeta. São 24 mil por dia, na maioria crianças desnutridas. São 820 milhões de famintos no mundo, apesar de se produzir uma quantidade de alimentos que daria para suprir todas as necessidades. Jacques Diouf, diretor da Food and Agriculture Organization (FAO), declarou que o combate à fome no mundo foi um fracasso coletivo.  A morte como consequência da fome é simplesmente inaceitável! Cada médico, cada cidadão,  deve levantar sua voz, manifestar sua indignação e fazer o que lhe for possível para que tais mortes não ocorram.
Diferente disso é a morte natural, a ortotanásia, que é parte do ciclo de vida, como bem definiu, poeticamente, Tagore em “Pássaros errantes”:
“A morte pertence à vida,
como pertence o nascimento.
O caminhar tanto está 
em levantar o pé
como em pousá-lo ao chão.”
Na cultura ocidental há uma grande resistência em se aceitar e até mesmo refletir sobre a morte. Quando se trata de médicos, a resistência tem o agravante de que, até inconscientemente, cada morte acaba sendo sentida como uma derrota na luta pela vida e pela saúde. No entanto, como diz um velho adágio: “a única coisa que, com certeza, se pode prever para o futuro é a morte”. Essa resistência em aceitar a morte natural acaba levando os médicos a determinar medidas fúteis de manutenção da vida, que nada trazem de positivo para o paciente, para seus familiares e para a comunidade. Essa insistência em não aceitar a morte natural, em luta inútil contra o fechamento do ciclo natural da vida, constitui a distanásia e, sob alguns aspectos, representa um desejo inconsciente de deificação de cada um. São muitos exemplos de manifestações contra a distanásia. Uma das mais emblemáticas foi a resolução do Papa João Paulo II, que, após prolongado sofrimento determinado por doença degenerativa incurável, em fase terminal, se recusou a voltar para o hospital, ficando em seus aposentos sem aceitar procedimentos fúteis para prolongamento da vida. As últimas palavras que pronunciou foram: “deixem-me partir para o Senhor”.
Os dias atuais assistem a uma luta contra o que se chamou de eutanásia, que seria a morte piedosa. O abreviar do ciclo da vida, de um modo geral, envolve os mesmos enganos encontrados em seu adiamento artificial por meio de medidas fúteis e inúteis de manutenção de uma vida sem qualidade. Na eutanásia, a ação ou omissão deliberada no sentido de apressar a morte, mesmo que bem intencionada e piedosa, tem sido objeto de amplas discussões e questionamentos.Eutanásia, em tese geral, e distanásia são os dois lados da mesma moeda, mas tratados de forma diametralmente oposta. Enquanto a distanásia encontra apoios e estímulos, a eutanásia é considerada crime pela Constituição e é vedada pelo Código de Ética Médica. Padre Léo Pessini, notável estudioso brasileiro sobre o assunto, nota “um silêncio bibliográfico em relação à distanásia e muita literatura sobre a eutanásia”, e considera um equívoco nomear qualquer interrupção de tratamento como sendo eutanásia.
O que se propõe no caso de paciente em terminalidade de vida: aliviar seu sofrimento induzindo morte piedosa (eutanásia) ou manter apenas os seus sinais vitais, com uso de meios agressivos, mas inúteis, mesmo que não haja prognóstico?
Aqui, entra o conceito de ortotanásia, o deixar morrer naturalmente, sem intervenções agressivas e inúteis, mas cercando o paciente de cuidados especiais que lhe permitam um morrer digno e sem sofrimento. A resposta à pergunta acima é encontrada nos chamado “cuidados paliativos”, definidos pela Organização Mundial de Saúde, em 2002, como sendo “a abordagem que promove qualidade de vida de pacientes e seus familiares diante de doenças que ameaçam a continuidade da vida, através de prevenção e alívio do sofrimento. Requer a identificação precoce, avaliação e tratamento impecável da dor e outros problemas de natureza física, psicossocial e espiritual”. É atividade multiprofissional que exige intenso trabalho de profissionais ligados à área da saúde, incluindo assistência espiritual. A visão holística do ser humano nos cuidados paliativos busca “cuidar” quando já não é mais possível “curar”. A Medicina Paliativa é atividade que cresce no mundo todo, já se constituindo especialidade reconhecida na Inglaterra desde 1987, e não se restringe aos casos de terminalidade da vida, sendo utilizada em outras situações.
A filosofia do cuidar, dos cuidados paliativos ao paciente terminal, está bem evidenciada nas palavras de Cicely Saunders:
“Ao cuidar de você no momento final da vida,
quero que você sinta que me importo pelo fato de você ser você,
que me importo até o último momento de sua vida e,
faremos tudo que estiver ao nosso alcance,
não somente para ajudá-lo a morrer em paz,
mas também para você viver até o dia de sua morte.”
Infelizmente, existe confusão em alguns setores com relação à ortotanásia, confundindo-a com a eutanásia em seu sentido criminal e considerando atitude passível de processo a restrição de recursos artificiais, por mais inúteis que sabidamente sejam. Pressionado por esse ponto de vista, o médico acaba por insistir em medidas fúteis, mesmo que elas não tragam benefícios para o paciente e seus familiares. A indicação de início e de suspensão de medidas médicas deveria ser de decisão médica. Mas, quem vai tomá-la equilibradamente sem segurança de que, mesmo fazendo o correto, não será punido por isso? E fica aí um círculo vicioso que mantém medidas sem valor prático, na esperança de milagres. O Conselho Federal de Medicina, por meio de resolução, procurou regulamentar o assunto. Buscou com isso dar ao médico segurança e tranquilidade para, diante de pacientes em terminalidade de vida, sem prognóstico e sem esperança, se abster das medidas fúteis, sempre após discussão e acordo com paciente (se for possível) e familiares. Foi um grande avanço, infelizmente derrubado pela visão equivocada de que essa atitude configuraria eutanásia e, portanto seria criminosa. Nenhum médico de boa formação teria a irresponsabilidade de suspender medidas realmente úteis, mas nenhum médico deseja que seu comportamento correto em termos científicos e humanísticos seja considerado um crime. Há necessidade de uma legislação clara que procure analisar estas situações de forma isenta, tendo como medida a dignidade do ser humano.

* Isac Jorge Filho é Doutor em Cirurgia, Ex-Presidente do Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo e Coordenador do Departamento de Bioética e História da Medicina do Centro Médico de Ribeirão Preto.

02 junho 2014

SAÚDE BUCAL / SERVIÇO PÚBLICO ODONTOLÓGICO

Ato pela valorização do serviço público odontológico e em defesa da saúde bucal no SUS

                                                           GILSON CARVALHO * 



Os cirurgiões-dentistas e os Profissionais técnicos e auxiliares da Odontologia que atuam no âmbito público no Estado de São Paulo, vinculados às três esferas de Governo (União, Estado e Municípios) INFORMAM que no dia 05 de junho de 2014, acontecerá ATO PÚBLICO denominado: “DIA ESTADUAL PELA VALORIZAÇÃO DO SERVIÇO PUBLICO ODONTOLÓGICO e DEFESA DA SAÚDE BUCAL NO SISTEMA ÚNICO DE SAÚDE – SUS”.
O Ato Público tem como objetivo apontar questões relevantes das políticas de saúde bucal e ausência das mesmas no Estado de São Paulo e seus municípios, de responsabilidade da União, Estado e Municípios, que inviabilizam o acesso universal, integral e equânime da população à saúde pública, garantia constitucional e dever do Estado. As ações de saúde bucal devem buscar a melhoria da qualidade dos serviços públicos, com eficácia, eficiência e efetividade dos programas de saúde bucal, cujo foco é o cidadão.
Além das ações que fragilizam o SUS, como é o caso dos subfinanciamentos e a visão de saúde como mera mercadoria, há violenta desvalorização dos profissionais que prestam assistência odontológica no serviço público.
Cirurgiões-Dentistas (CD), Técnicos em Saúde Bucal (TSB), Técnicos em Prótese Dentária (TPD) e Auxiliares em Saúde Bucal (ASB) realizam suas atividades, muitas vezes, em condições precárias para garantir atendimento digno e de qualidade à população.
Além disso, a inexistência de plano de carreira aos cirurgiões-dentistas e demais profissionais da saúde bucal e o disparate estabelecido entre a remuneração dos médicos e dos cirurgiões-dentistas, configuram evidente aviltamento, desrespeito e desvalorização profissional. Assim como o médico, o cirurgião-dentista é profissional da área da saúde que realiza atividades de alta complexidade, com similaridades quanto ao diagnóstico, prescrição medicamentosa e tratamento, sendo os dois únicos profissionais competentes legalmente para realizar diagnóstico e emitir prescrição, o que justifica tratamento igualitário em todos os âmbitos.
O protesto reunirá profissionais da Odontologia que atuam nas redes municipal e estadual, bem como aqueles que prestam assistência odontológica através do Programa de Valorização Profissional da Atenção Básica (PROVAB), com o objetivo de alcançar os seguintes pleitos:
ü  A Odontologia deve ser valorizada como uma área integrante do campo da Saúde e seus profissionais são protagonistas destas atividades;
ü  O Estado, nos diferentes níveis de governo e âmbitos de poder, deve superar o subdimensionamento atual da rede assistencial, a fim de assegurar à população serviços públicos odontológicos bem estruturados, tanto os da administração direta e indireta, quanto os da rede particular conveniada no âmbito do SUS, com profissionais adequadamente remunerados, visando à provisão de cuidados odontológicos de qualidade e o exercício da saúde bucal como um direito humano universal;
ü  O Estado Brasileiro deve cumprir com as garantias constantes na Constituição Federal, ordenando a formação de recursos humanos e garantindo às entidades odontológicas a participação na definição destas políticas;
ü  Concessão de melhores condições para o exercício da Odontologia no Sistema Único de Saúde, com garantia de materiais, equipamentos e pessoal necessários ao atendimento digno e de qualidade à população no âmbito do Estado e das Municipalidades;
ü  Criação do Plano de Cargos, Carreira e Salários para os Cirurgiões-Dentistas e demais profissionais da Odontologia, com reavaliação das tabelas de remuneração salarial dos municípios, do Estado e da União, com restabelecimento da equiparação salarial do cirurgião-dentista com os médicos e a valorização das profissões;
ü  Equiparação da bolsa concedida aos cirurgiões-dentistas no PROVAB atingindo o mesmo valor e benefícios concedidos aos médicos;
ü  Criação do Cargo de Especialista em Saúde – Cirurgião-Dentista, no município de São Paulo.



O autor adota a política do copyleft em seus textos disponíveis no site:  www.idisa.org.br
"Quando a circunstância é boa, devemos desfrutá-la; quando não é favorável devemos transforma-la e quando não pode ser transformada, devemos transformar a nós mesmos."
Victor Frankl - Psicólogo e prisioneiro de Auschwitz