Quando vi o primeiro, imaginei que ali estivesse uma coisa improvisada e temporária, para resolver alguma emergência. E era “apenas” uma carroceria dupla. Ainda assim, ocupava grande espaço, dificultando o trânsito e oferecendo perigo aos demais veículos. Depois vieram os conjuntos de três “vagões”. Ficaram tão comuns que receberam nome próprio: “treminhões”. No ritmo em que a coisa anda, logo teremos verdadeiros comboios nas estradas. Que se danem os demais usuários de nossas vias rodoviárias de comunicações! Tudo pela economia! Tudo pelo lucro!
O número de acidentes nas estradas é enorme. Vidas sacrificadas, incapacitações definitivas ou temporárias, constituem o saldo negro desses acidentes. Todas as medidas que possibilitem maior segurança são válidas e indispensáveis. Está aí um “novo” código de trânsito, lançado com pompa e intensa divulgação. No entanto, temos transitado por estradas da região e continuamos convivendo perigosamente com “treminhões”. O número de acidentes teoricamente deverá ser mais alto que o que ocorre com caminhões de carroceria simples. Basta pensar na dificuldade para as ultrapassagens. Recentemente um jovem médico perdeu a vida em acidente envolvendo um desses veículos. Há menos de um mês a mídia divulgou outro acidente fatal.
Que benefícios trazem os “treminhões”? As estradas não foram feitas para suportarem tais tipos de veículos. O número de empregos cai, na medida em que três caminhões são substituídos por um único. O perigo aumenta para todos os usuários de estradas onde existem tais veículos. Assim, os únicos benefícios são de ordem econômica, e assim mesmo para poucas pessoas. Será que isto é justo? Será que vale a pena?
Há um aspecto de ironia política e econômica nessas constatações. A partir da segunda metade do século passado o transporte ferroviário foi praticamente dizimado para dar lugar ao rodoviário. Tudo passou a girar em torno da indústria automobilística e do petróleo, incluindo o transporte de carga. E vinha em total contra-mão da história. Todos os países desenvolvidos, principalmente os territorialmente grandes, usaram e usam amplamente a via férrea. Aqui, sabe-se lá por que tipo de acordo, o transporte ferroviário foi sucateado. Perde a economia do país e a segurança nos transportes. Na verdade não se trata de uma disputa por espaço entre via ferroviária e via rodoviária. Podem conviver muito bem. Recentemente pude constatar em um passeio de barco pelo rio Meno, na Alemanha, que, enquanto desciam barcaças carregadas de mercadorias pelo rio, em uma das margens uma ferrovia permitia passagem de grandes comboios e na outra margem, por uma rodovia, passavam carros e caminhões. Era a mostra clara da possibilidade de co-existência entre os três tipos de transporte. O interessante é que o menor movimento era o rodoviário.
Voltemos aos treminhões: parece que querem substituir os comboios ferroviários por comboios rodoviários. O custo desse absurdo será pago com vidas e com muito prejuízo financeiro. Não se corrige um erro com outro.
A propósito, vale lembrar os últimos processos eleitorais: salvo algumas poucas manifestações pontuais e superficiais não tomei conhecimento de nenhum projeto consistente e profundo de retomada do transporte ferroviário no País ou nos Estados. Até o “trem-bala”, tão noticiado, e que não representa a retomada da via ferroviária no País, já deixou de freqüentar a mídia.
O que se reserva para o futuro na área do transporte? Nossas ruas e estradas já não suportam mais a sobrecarga de veículos. Tememos que o próximo passo nessa "evolução" seja dado com comboios ainda maiores: os “tetraminhões”? Ou, quem sabe, “pentaminhões”?
Um comentário:
Como sempre, no cerne da questão. Em tempos de Copa do Mundo, teremos talvez "hexaminhões". Meus antepassados na "bota" já diziam: Qui prodest? (a quem interessa?, quem se beneficia?, quem leva vantagem?). Encontre-os e terás as respostas...
Abraços
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