20 abril 2011

INDÚSTRIA BÉLICA: O MAIOR E MAIS SUJO NEGÓCIO DO MUNDO

INDÚSTRIA BÉLICA: O MAIOR E MAIS SUJO NEGÓCIO DO MUNDO
Isac Jorge Filho

Fui estudante universitário, na USP-Ribeirão, em tempos de profunda politização do movimento estudantil. Como conseqüência vários colegas foram presos ou precisaram deixar Ribeirão ou, até mesmo, o País. Falávamos de um Brasil mais justo e humano, que não tivesse atrelado aos interesses dos poderosos, fossem brasileiros ou estrangeiros. Elegíamos como algoz maior uma coisa chamada “complexo industrial militar”, que ditava os rumos do mundo em função de seus interesses comerciais, disfarçados como “luta pela democracia” ou “luta anti-comunista” geralmente ficando atrás das cortinas e agindo por meio de terceiros que realmente acreditavam nessa corrente ou que eram testas de ferro contratados. Entendíamos que as sedes desse complexo estavam espalhada pelo mundo, com a unidade central nos Estados Unidos. O golpe militar de 1964 varreu essa juventude universitária politicamente esclarecida. Todos conhecem muito bem a história daquela época.
Leio agora, quase meio século depois, que o gasto militar tem crescido, chegando, em 2008, ao quase inacreditável total de US$ 1,46 trilhão, que correspondem a R$ 2,85 trilhões. O dado é do Instituto Internacional de Estudos para a Paz (Sipri) sediado em Estocolmo, Suécia. Quero me aprofundar na análise desses dados.
O convívio, no mundo “globalizado” tem nos tornado insensíveis ao que representam os grandes números. Um telespectador se horroriza, com razão, diante de um crime cometido na rua, mas não presta muita atenção à notícia de um bombardeio que matou 80 pessoas, inclusive crianças, na Líbia, Iraque, Afeganistão, Kosovo e tantos outros países...afinal é tão longe! Essa “anestesia” de sensibilidade é produto da chamada globalização, como também o é não se indignar ao saber que o gasto com armamentos é mais que 190 vezes maior que o que se gasta para combater a fome, promover o desenvolvimento agrícola e melhorar, e forma paliativa, a situação nutricional das populações de países pobres que lutam contra a dificuldade de obter alimentos seja pela baixa produção, seja pelo alto preço. São dados da FAO, divulgados a partir da Conferencia de Alto Nível sobre Segurança Alimentar realizada em Roma. É indispensável que cada um pare e pense um pouco: o mundo gasta para matar mais que 190 vezes o que gasta para aliviar a fome da população mais pobre do planeta.
Volto a lembrar do “complexo industrial militar”. Estávamos certos, é ele mesmo o grande vilão. E continua agindo por meio de terceiros, nos últimos tempos incluindo a OTAN e a própria ONU. Derrubam governos, elegem ou impõem governos, que, muitas vezes, acabam sendo nada mais que executivos de luxo de um interesse maior, que é absolutamente comercial. Afinal, eles tem o melhor negócio do mundo: fabricam e vendem armas que, em última análise, são pagos com o dinheiro do povo para o qual essas armas levaram morte e destruição. Ou alguém ainda acredita em “ajuda” militar?
O Iraque sairá, um dia, do domínio a que está submetido a partir de uma guerra baseada em mentiras, hoje admitidas até pelos seus executores. Mas talvez não saia nunca mais do lodaçal econômico em que se envolveu, já que terá que pagar dólar por dólar, euro por euro, libra por libra, cada bomba que foi jogada sobre sua população. Ou será que ainda pensam que esses gastos ficarão por conta dos Estados Unidos ou da Inglaterra? Ou ainda, ingenuamente, que a indústria bélica vai pagar a conta?
Agora é a vez da Líbia. De repente descobriram que Kadhafi (ou Gadhafi ou seja lá o que for) é um ditador sanguinário. Parece que ele sempre foi, mas não haviam desconfiado disso enquanto forneciam armas para seu exército (fornecer, aqui, significa vender mesmo). A OTAN passa a despejar bombas na Líbia. Alguém vai pagar por elas. Não será a indústria bélica. Os rebeldes estão pedindo armas. Certamente pagarão por elas e se vencerem comprarão mais (e isto aparecerá como “ajuda”). Se Kadhafi vencer comprará mais armas. Se ficar muito feio comprar oficialmente ele o fará “no paralelo”, mas o dinheiro irá para o mesmo lugar.
A filosofia do complexo industrial militar é claramente traduzida na idéia “fantástica” da “bomba limpa”. E o que vem a ser isso? Nada mais, nada menos que uma bomba que mata pessoas, mas não destrói casas, propriedades e objetos. Pronto, está aí a definição de objetivos dos que comandam o mundo: as propriedades e os bens materiais valem muito mais que as pessoas, que a vida.
Lamentavelmente o poder no mundo decorre do dinheiro. O dinheiro vem principalmente dos negócios e não há melhor negócio no mundo do que produzir e vender armas. Pena que o preço maior não é pago em dinheiro, mas em vidas e desgraças. Até quando?
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9 comentários:

Unknown disse...

concordo integralamente com o artigo, chamando atenção para aquilo que deve ser o objetivo de todas as políticas e ações do ser humano: a defesa da vida. Isto de ve ser pensado também em termos da aplicação da justiça em nosso país, qual seja defender a vida em primeiro lugar.

euripedes balsanufo carvalho

Unknown disse...

Regina Parizi
Essa "industria" nem está tão longe
assim,pois o seu varejo está na com
pra pela internet.
Vide as inúmeras vítimas feitas nos
colégios americanos e,agora,no Brasil,no Realengo.

Bié J Leite disse...

Prof. Isaac, achei muito interessante e atual esse seu artigo e concordo que essa “anestesia” de sensibilidade seja produto da banalização das noticias que sem duvida a globalização é a responsável , pois você vê abundancia de tragédias em todos os lugares do mundo, num único noticiário de TV .
Da mesma forma sua observação sobre a insensibilidade aos grandes números , referindo-se ao quase inacreditável total de US$ 1,46 trilhão, que correspondem a R$ 2,85 trilhões gastos com armamentos , precisaria ser revertida. Ficaria mais palpável saber que essa quantia gasta é quase o PIB do Brazil (R$ 3, 67 Trilhões) que é hoje o 8º do mundo .
Creio que também quando se comparam números sem chamar atenção sobre eles , essa avalanche de informações vindas pela globalização da mídia , faz com que a frase perca o impacto e sua importância ; --190 vezes maior é o gasto com armamento do que se gasta para tentar sanar a fome no mundo- talvez fosse mais chocante saber que o país estava tentando comprar 36 caças militares, estimados em R$10 bilhões,e que segundo o parágrafo anterior precisaria de apenas mais 5 bilhões para acabar com a fome não no Brasil, mas no mundo todo.
Esse seu artigo me fez lembrar do chocante filme Lord of War ( O Senhor das Armas) , drama de 2005, escrito e dirigido por Andrew Niccol.
Neste filme é revelado que o maior comerciante de armas do mundo é o exército dos Estados Unidos da América, e que em um ano, o maior traficante internacional vendia menos armas no mundo do que os EUA produziam em apenas um dia”.
O filme acaba afirmando que os cinco membros permanentes do Conselho de Segurança da ONU, EUA, Reino Unido, França, Rússia e China, são os maiores comerciantes de armas do mundo .
Nesse mesmo filme comenta-se ainda que as verdadeiras armas que mais ceifam vidas, não são mísseis ou bombas de hidrogênio, mas sim as pequenas armas, de fácil manuseio por qualquer pessoa: pistolas e metralhadoras”.
Esse seu artigo vem bem a calhar , após o massacre dos alunos de Realengo, como salientou a ReginaParizi e a volta da historia do desarmamento que os políticos aproveitaram para tentar justificar os votos que conseguiram nas eleições.
Sua conclusão é muito pertinente : não há melhor negócio no mundo do que produzir e vender armas, principalmente se para ambos os lados .
Pena que o preço maior não é pago em dinheiro, como você bem frisou, mas em vidas e desgraças de uns , porem o que interessa é o lucro .
Sem duvida o país destruído em toda sua infra-estrutura , vai ter que pedir ajuda aos países ricos, que são os próprios fornecedores de suas armas .
Ganha-se dinheiro na destruição e depois na reconstrução e é por isso que de vez em quando precisa-se inventar uma guerra em algum lugar deste planeta.
Abraços e continue a nos brindar com seus pensamentos.
Gabriel

Unknown disse...

Querido e eterno Professor Isac,
Instrutivo, realista e amplo artigo sobre questão importante,atual.

Assunto que se encontra encoberto por véu do silêncio e ignorância por parte de todos nós (exceto vc), para felicidade dos que exploram essa indústria.

Obrigada por iniciar a descobrir o tema e anos ajudar a refletir.

Abraços
Patro

Roberto disse...

Caro Isac,
Sua indignação é a minha e, creio, de todas as pessoas sensatas. Você, como sempre, acerta no "timming" do post visto que após os fatos em Realengo, a justa perplexidade da sociedade requer medidas. Ideólogos da direita, a mídia mainstream, a bancada da bala e até pessoas que jamais tiveram armas (?) se posicionam fontalmente contra a idéia de mais restrições à venda de armas embora os números confirmem que quanto mais armas em poder de pessoas comuns maior é o número de incidentes e tragédias. A falácia esgrimida pelos grupos acima, a liberdade do indivíduo, é insustentável pois a coletividade está ameaçada. Todo esse barulho desses grupos é causado apenas pelo temor de perder o mercado de armas leves nacional. Imagine o que não deve fazer o complexo industrial-militar dos maiores fabricantes em termos de pressão sobre seus congressistas, mídia e populações.
A realidade é sombria. Os que vão perder as guerras compram muitas armas e os que vão ganhar compram mais ainda, antes, durante e principalmente depois dos conflitos pois teem que ressarcir a indústria bélicas dos seus investimentos na produção de cadáveres.
Muito bom post, fiquei feliz com a qualidade dos comentaristas. Você precisa escrever mais. Abraços .'.

Mauricio disse...

Neste exato instante em que escrevo o meu comentário várias vidas estão sendo ceifadas pela violência que percorre o nosso planeta. Vivemos a era da banalização em que a morte pela violencia passa a ser um fato da vida cotidiana. No cenário glogal a indústria bélica depõe governos, transfere riquezas para as mãos de poderosos, vitima milhares de inocentes. No cenário das pequenas comunidades a indústria bélica fomenta a guerra civil, a violencia em bairros, escolas, universidades. A pergunta é para que precisaríamos de armamentos se apenas seguíssemos os mandamentos do Cristo? A resposta talvez seja: Cristo está deixando de ser um valor presente nos lares, na sociedade e no coração de cada um. Para alguns povos Cristo nunca existiu. Para outros nunca deverá existir. Para os senhores dos armamentos o único poder existente é o da força bruta e econômica.
Felicito o Prof. Isac pela clareza com que expõe este tema tão atual em nossas vidas.

Alfredo Dellaringa disse...

Perfeito. Basta ver quantos presidentes á foram executados por
interesses armamentistas. É e infelizmente vai continuar a ser a
industria mais poderosa, só que sem fazer propaganda ou deixar que
falem dela. Boa Páscoa. Alfredo

Unknown disse...

Caro Dr. Isac, distinto e competente Mestre na arte de ensinar! Congratulo-me com a clareza de seu artigo e pertinência para este especial momento! Sem nenhuma dúvida, as ditaduras que assolaram os países da América do Sul já estavam a serviço dessa indústria bélica. Hoje, ela se mantém tomando como alvo oficial o combate a governos de vários outros países. Mas, também, está sendo mantida pelo combate ao tráfico e pelas armas que são colocadas nas mãos de bandidos e "pessoas de bem". A sua publicação é oportuníssima e valeria muito estar disponível em outras mídias para uma abrangência muito maior! É uma reflexão necessária que poucos poderiam fazer com a sua competência, brilhantismo e didática! Sugiro um contato com a Secretaria Municipal de Educação para que o artigo seja disponibilizado nas escolas acompanhado por um debate, quem sabe, com o grande mestre.
Um grande abraço.
Cezar L. Natal

Anônimo disse...

Excelente reflexão sobre os piores males da humanidade, a ganância e a crueldade por de trás do complexo bélico industrial, o melhor exemplo do que há de pior no capitalismo, somente equiparado ao uso de cobaias humanas no terceiro mundo pela indústria farmacêutica. Aliás, nos faz lembrar dois grandes filmes (um pouco de autocrítica do mundo dito desenvolvido): “O Senhor das armas” e “Jardineiro Fiel”. Caro Professor Isac, quem sabe, quando a maioria das pessoas tiver acesso a tais informações, a humanidade possa se repensar; para prejuízo dos senhores das armas.
Enidio Ilario