ESTA NÃO É A PONTE DE POTTER E DA BIOÉTICA
Isac
Jorge Filho*
Van Rensselaer Potter,
brilhante oncologista norte-americano, foi o primeiro a utilizar o termo
“Bioética”. Seu livro “Bioethics: a
bridge to the future” (Bioética: a ponte para o futuro) marcou o início de
uma era de estudos voltados para a vida e o bem-estar. É espantoso que
exatamente o título do livro de Potter tenha sido utilizado, sem nenhuma
citação de autoria, por um grupo de políticos. A verdade é que, cada vez mais,
nos surpreendemos com o nível da maioria deles, independente do partido a que
pertençam. Usar frase dos outros, sem citar a autoria, certamente é “café
pequeno” para essas figuras.
Acabo de receber um editorial
da Sociedade Brasileira de Bioética, de autoria de sua presidente, Regina
Parizi de Carvalho, mostrando a revolta dos bioeticistas brasileiros ao ver
usurpada uma frase-símbolo da Bioética.
Vale a pena divulgar “in totum” esse editorial:
“Vivemos em tempo de turbulências, de crise ética e política de uma
dimensão sem precedentes, no que se refere à manipulação das informações e ao
número de pessoas envolvidas. O mundo chocado assiste e se manifesta sobre a
crise econômica, politica e moral que abate o Brasil.
As pessoas e as entidades mostram- se
atônitas com o desenrolar de fatos marcados pela corrupção, tramas diabólicas,
perseguições, acusações sem evidencias, entre outras questões; que revelam a
falta de respeito e de compromisso com a sociedade, sobretudo, de membros da classe
política envolvida com setores financeiros e empresariais.
A
crise, no entanto, revela hoje a sua face mais cruel, pois com a assunção do
governo interino, surge a nova proposta de governança “de uma ponte para o
futuro”, calcada em medidas restritivas e de desconstrução dos direitos sociais
na saúde, educação, cultura, entre outros.
Nada poderia ser mais irônico para a área
da Bioética, que nasceu do “imperativo” de Potter, de que o futuro deveria ser
baseado em condutas e políticas fundamentadas na autonomia, na solidariedade, e
na responsabilidade para com as gerações atuais e futuras e com nosso planeta.
Hoje, ao contrário do fator desencadeador da crise política, não
há compromisso em combater a corrupção e será a sociedade que pagará o preço da
crise neoliberal, de globalização da economia, iniciada em 2008 nos países mais
ricos e que, desde então, vem se espraiando aos demais países.
Do remédio que não funcionou aumentar a
dose. Ampliando o projeto neoliberal de desconstrução dos direitos e da
regulação ético-institucional, como o PL 200/2015, que propõe a retirada do
controle da sociedade sobre as regras éticas das pesquisas com seres humanos.
Das
epidemias e endemias, isolar o país ou a região, como aconteceu com a África
recentemente e agora com o Brasil, na epidemia do Zika e as Olimpíadas. Isto,
em vez de aumentar esforços financeiros, científicos e sanitários para
beneficiar a totalidade da população local e internacional.
Assim,
associados e militantes da bioética, independente de concepções político-partidárias,
temos o irrenunciável papel nos debates e lutas pela manutenção e avanço de
medidas éticas comprometidas com uma sociedade justa e solidária.
Contamos com vocês!